segunda-feira, 23 de maio de 2011

Pobre, Rica Língua Portuguesa!

por Massaud Moisés*
O povo que respeita sua língua ainda é capaz de sustentar certos valores e defender certos princípios. Quando a língua é maltratada, com vem acontecendo, a própria comunicação das idéias, das informações e do sentido das coisas começa a se alterar. Quando o povo começa a usar o onde e o aonde nos lugares mais esquisitos ; quando começa a usar o de que em todas as posições possíveis e imagináveis, é porque a língua já perdeu muito de sua força de expressão.

O estudante de português tem um álibi: esta é a língua que eu falo, com ela consigo me comunicar, com ou sem erros. E acha então que pode desleixar. Estuda, quando estuda, porque o vestibular cobra, o concurso público cobra. Já ao estudar uma língua estrangeira, o cidadão procura domina-la ao máximo e da melhor forma. As pessoas não gostam de ser apanhadas em erro de inglês, francês, alemão. Podem passar uma imagem de ignorância . Já o português...

Quando a lingüística vem e diz que o erro não existe, reforça o álibi. A lingüística no ensino secundário deu apoio às pessoas que estavam já maltratando o português desde há muito tempo, ou que começaram a maltrata-lo. Por que o professor não de dizer “não vou ensinar nada, o erro não existe”? Até que chegamos a esta coisa que existe aí, de querer salvaguardar, segundo dizem eles, a linguagem falada pelas pessoas mal-informadas da periferia. Como se democratizar a ignorância fosse democracia, quando é exatamente o oposto. Então para que a escola?

A escola serve exatamente para ensinar a língua que não é a falada pelos que não tem escola. Ensinar a língua que está nos livros dos maiores de sua literatura – a língua, enfim, que está nos depósitos de cultura. A escola tem de dar ao estudante a chave desses patrimônios da língua. Se não for isso, para que ensinar o português no Brasil, o inglês na Inglaterra, o francês na França? A progressiva deterioração da língua portuguesa no Brasil tende a levar à descaracterização, à perda da própria identidade.

Outro álibi: dizer que o português que se fala em Portugal é outra coisa, a nossa é a língua brasileira. Eles não admitem que isto aqui seja um dialeto do português de Portugal, mas um única língua. Não, é outra coisa, dizem eles, e essa outra coisa acaba sendo esse português abastardado de todos os dias. Aí entra a lei do mínimo esforço. Não há erro, é outra língua. Ora, então os professores de Português podem acomodar-se. Ganham uma miséria mesmo... É um círculo vicioso. Mas o professor de verdade deve prosseguir na luta.

Esta luta está, sim, consumindo todas as energias dos professores. E, o que me parece pior: está consumindo todo o seu ideal.
*Massaud Moisés é rofessor da USP (Universidade de São Paulo).
Fonte: http://www.zaibatsum.blogspot.com/
Colaboração: Sérgio Orlando Pires de Carvalho

Nenhum comentário: